“Amoras silvestres no passeio público”

A casa nova tem uma amoreira enorme na esquina. Tão enorme que quase não conseguimos alcançar as amoras pra comer. Fico na ponta dos pés, as crianças sobem na cerca do prédio e, então, saboreamos o gosto de lar. Todos os dias vou passear com a Maní de havaianas, e volto com a língua e o dedão do pé bem roxinhos. Com cara de lar.

A casa nova é três ruas pra cima da velha. E um pouquinho pro oeste. Mudamos, mas ficamos no mesmo bairro – como um desmame gradual da vida nômade, depois das tantas outras mudanças enormes que fizemos.

A casa nova permite que as crianças continuem na mesma escola de antes – uma dádiva considerando-se o mercado imobiliário dessa cidade que escolhemos viver. Ainda sinto meus ombros relaxarem cada vez que me lembro desse fato. Ufa! Uma mudança a menos pros filhos dessa família com rodinhas nos pés.

Arrumei a mudança pra casa nova apreensiva com o espaço que, supunha, iria faltar. Nas madrugadas insones dos dias exaustivos, meu cérebro se inquietava por não saber onde guardaríamos as toalhas ou como faríamos pra cachorra não rolar escada abaixo. Mas a casa nova nos recebeu com braços perfeitamente abertos e em cada canto seu coube uma das nossas coisas.

Ajustes possíveis e encaixes perfeitos foram alargando em meu peito os espaços que me pediam – e possibilitavam – os suspiros aliviados; minha alma vai, agora, pedindo: “favor aterrar por aqui”.

As mudas de amoreiras (que sigo tentando fazer pegar, agora, da enorme amoreira da esquina) pretendo plantar em vasos. Vasos onde caibam raízes profundas.

Na casa nova sinto vontade de ter raízes. A casa nova me convida a plantar – ontem já plantamos dois tomateiros.

A casa nova já tem quase tudo no lugar: meus livros nas estantes, gatos um tiquinho mais donos do espaço, crianças felizes lendo e ouvindo músicas por horas a fio em seus novos quartos, a cachorra ceguinha quase menos perdida, marido usando bastante suas ferramentas hahaha

A casa nova já é tão nossa que já dá pra deixar o ” nova” de lado e chamar de “nossa casa”. Com amoreira em vasos e gosto de lar!

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